No ar dançava o inebriante aroma do incenso e no chão havia um trilho romântico de velas acesas, perfumadas. Uma a uma, deixei que me guiassem sabendo que me conduziriam até ti… encontrei-te… naquele esconderijo onde a luz era mais intensa. O quarto estava cheio de ti, a tua sombra era desenhada nas paredes pela chama das velas acesas, o teu perfume sobrepunha-se a todos os outros aromas. Aproximei-me devagar e coloquei nos teus lábios um beijo leve e doce… tão doce, tão quente. Deixei que o teu corpo se despojasse de roupa e de timidez e deitei-te nua sobre as almofadas do chão. No leitor de CD tocavam acordes de Bach, nos copos escorriam as gotículas do vinho tinto, nos vidros reflectia-se o brilho da Lua e senti que o teu corpo tremia e me desejava, como o meu desejava o teu, como se fosse a primeira vez.
Era a primeira vez entre nós.
O amor fez-se… o amor faz-se… de pequenos gestos, de pequenos nadas, de insignificâncias. De velas e aromas, de palavras sussurradas ao ouvido, de arrepios na pele, de respiração a arfar, de corações a bater descompassados. A chama do amor não precisa ser uma chama avassaladora, que nos faz arder na sua combustão, mas tem que ser espevitada, tem que iluminar o corpo e a alma… para nunca se deixar morrer.
Não posso negar o que vi, o que cheirei, o que senti, o que amei. Numa noite decorreram décadas de paixão e amor que nunca tinham acontecido. Éramos tão crianças ainda, que sabíamos nós do amor naquela época?
Não posso negar que fui feliz se fecho os olhos e sinto ainda todos os instantes felizes. Não, não posso negar que atravessei rios contigo, que te ensinei o nome das estrelas, que ouvimos juntos os pássaros e o vento nas árvores, que caminhei pelas ruas de mãos dadas contigo e que havia uma luz ao fundo e essa luz indicava o caminho. Enquanto me lembrar estarei vivo e, vivendo, não deixarei morrer quem caminhou comigo, ao longo do caminho.
Ainda que não estando presente. Agora reencontrámo-nos, e o amor consumou-se.