Ele vivia sozinho há uns meses. Não lhe faltavam candidatas para preencher o lugar vazio da sua cama de casal. De vez em quando, lá saía com uma. O problema era quando elas se atiravam descaradamente e queriam fazer dele embrulho em lençóis. Não que ele fosse frio, pelo contrário, adorava sexo. Só que não era capaz…
Tinha dado tudo àquela mulher, como na canção do Paulo Gonzo: não só os anéis mas também os dedos, que ela não tinha devolvido. As suas mãos ainda percorriam o corpo dela em pensamento, todas as noites, quando ficava horas e horas sem dormir. Tinha-se dado totalmente a ela, tinha querido fundir-se nela, mas ela já não o queria. Ou talvez quisesse?
Às vezes, ela mostrava sinais de querer uma reconciliação e ele ficava esfuziante. Era agora que tudo ia voltar à normalidade. Porém, sem bem saber porquê, voltava a frieza. Ele não se dava conta que era apenas ele que alimentava a chama da idolatria por ela. Ela apenas correspondia em dias que se sentia mais carente e em que a obsessão dele a fazia sentir-se desejada. Ela não estava a ser correcta e sabia-o. Talvez tivesse pena dele. Talvez o fizesse em memória dos dias felizes, mas não o amava mais. Ele queria dar tudo em troca de nada. Sofria por amor, preso a um sentimento desprezado. Não era masoquismo, era apenas protecção. Afinal, era mais fácil viver no passado, preso a um amor idealizado do que dar a oportunidade a uma outra mulher. Podia apenas querer usá-lo, poderia apenas querê-lo para depois abandoná-lo de novo. Para quê dar hipótese àquela mulher doce que o atraía muito? O medo de não ser amado era demasiado grande…
Mas ele era paciente, sempre fora assim. Nunca fora de precipitar-te sobre as coisas, nem de se apressar. Tomava sempre o seu tempo. Ele sabia que a pressa é inimiga da perfeição e para ele, perfeição era saborear o momento com tempo. Às vezes, deixava escapar algumas oportunidades. Outras vezes, colhia os frutos que tinha semeado há muito tempo atrás.
Demorava a preparar-se de manhã. Tomava banho lentamente, sentindo na pele, a macieza do seu gel preferido e a água a escorrer-lhe pela pele. Desfazia a barba com calma, pormenorizadamente. Gostava de comer devagar. Reter o gosto na boca mais tempo. Sofria do stress do trabalho como os outros mas a lentidão tornava-o mais perfeccionista.
Talvez por ser assim, sentia-se sempre atraído por mulheres eléctricas, recheadas de vida. Como ela, tentava tocar-lhe com o seu olhar quente, mas ela quase nem reparava nele, e assim permanecia demasiado na sombra. Apesar da indiferença e das rejeições, mantinha-se firme. Sabia que não sendo ela, havia de encontrar, aquela que o haveria de arrebatar com paixão, aquela que viria repousar na sua doçura. Era só uma questão de deixar aqui e ali umas gomas de carinho, uns rebuçados de amor, uns quadradinhos de prazer. Sabia bem que mais tarde ou mais cedo, conseguiria cativar toda aquela energia. Era só esperar…
O amor é como um puzzle. Todos os dias colocam-se peças no grande puzzle que são os afectos e o amor. Há dias em que se encontram peças que encaixam na perfeição e há dias em que se descobre que houve um engano, que há peças desirmanadas que não encaixam em lado nenhum. Fica ele a pensar que talvez o puzzle onde viveu os últimos anos não seja a paisagem onde quer ficar o resto da vida, que tem de mudar de puzzle porque aquelas peças que pareciam perdidas são exactamente aquelas que são a chave para a felicidade. Urge a mudança e ele sabe que não pode adiar para sempre…