NAO POSSO - poema de Julio Dinis
Pedes-me um canto, anjo? Ai não, não sei cantar-te, Hinos para elevar-te
Não sabe a minha voz. Os grandes sentimentos As majestosas cenas Sentimo-las apenas;
Que mais podemos nós?
Qual é a linguagem,
Que as sensações exprime
Dessa hora tão sublime
Das confissões de amor?
Se um ente amado expira...
Junto ao lutuoso leito,
Do que nos vai no peito
Quem pode ser cantor?
Nas praias do oceano
Ao som dos seus bramidos
Enlevam-se os sentidos,
Escuta o coração.
E as horas passam rápidas,
Delícias sonha a mente...
Mas, o que então se sente
Cantar se tenta em vão.
Sob as arcadas tristes De templo sacrossanto Sobe, com fervor santo, O pensamento a Deus. Da fé íntima e pura
A alma aí se inspira... Porém pode a lira Cantar nos hinos seus!
Ai não me peças cantos! O sentimento é mudo, Diga o silêncio tudo Quanto eu não sei cantar
Mas, se amas... se no peito
Íntima voz te fala,
Tudo o que a lira cala
Lerás num meu olhar